quinta-feira, 5 de agosto de 2010

O código Notre-Dame

Descemos os 386 degraus - agora tudo de uma vez só, sem paradinhas - e chegamos ao solo por volta do meio-dia. Como a fila estava enorme e já havíamos comprado os ingressos para visitar a Saint Chapelle e a Conciergerie no período da tarde, optamos por apreciar o exterior da catedral e deixar a parte interna para ser vista no dia seguinte.

As estátuas e relevos que adornam a fachada ocidental são, na verdade, narrativas visuais que compõem um código que era bastante conhecido pela população da época. Os personagens eram facilmente identificados em função dos objetos que portavam, dos trajes que usavam ou mesmo das atitudes em que eram retratados. Conseguimos decifrar parte desse código por meio da observação e dos conhecimentos anteriores que tínhamos, mas alguns dados que serão expostos nesse post serão novidade também para quem fez parte do grupo. Mas não tem problema, na nossa próxima passada por Paris a gente vai olhar de novo, agora sabendo interpretar melhor as esculturas.



No centro da fachada o destaque vai para a enorme rosácea de 9,60m de diâmetro que forma uma espécie de halo envolvendo uma estátua da Virgem com o menino entre dois anjos. Se a igreja é dedicada à Nossa Senhora, é dela o destaque principal.




Nas laterais da rosácea há estátuas de Adão (á direita) e Eva (à esquerda), para que os fieis se recordem do pecado original. Abaixo da balaustrada encontra-se a galeria dos reis, um friso composto por 28 estátuas de 3,5m de altura cada. Do chão não se tem ideia de que elas têm todo esse tamanho!

Essas estátuas representam as 28 gerações dos reis de Judá, descendentes de Jessé e ancestrais humanos de Maria e Jesus, e foram acrescentados à construção no início do século XIII. Rapidamente passaram a ser vistas pela população da época como representações dos reis franceses, e essa interpretação perdurou pelos séculos seguintes. Foi por isso que, durante a Revolução Francesa, as estátuas foram atacadas e mutiladas como símbolo do despotismo monárquico. As peças originais, com as marcas da destruição, são as que se encontram no museu de Cluny; essas que hoje decoram a fachada da catedral foram redesenhadas por Viollet-le-Duc.

A fachada da Notre-Dame conta com três portais e quatro estátuas em sua parte inferior.







A estátua da esquerda representa São Estêvão, que foi diácono (auxiliar na assistência aos pobres e no ato de ministrar os sacramentos) dos Apóstolos.










A da direita mostra Saint Denis, o primeiro bispo da cidade e um dos padroeiros de Paris.











As outras duas estátuas, colocadas em ambos os lados do portal central, são alegorias: a da esquerda representa a Sinagoga, que tradicionalmente é mostrada com uma venda ou algo cobrindo seus olhos. Isso porque há uma base comum nas religiões judaica e cristã, aquilo que faz parte do Antigo Testamento da Bíblia. Porém, os judeus não aceitaram Jesus como o filho de Deus, por isso o templo judaico é representado como incapaz de enxergar a verdade.

A coroa, que representava seu poder, está caída a seus pés e o bastão com o estandarte apresenta-se quebrado. Quanto ao que cobre seus olhos... parece a cauda da serpente!


A estátua da direita é a alegoria da Igreja, que é representada com atitude triunfante: tem a coroa na cabeça, segura com firmeza o estandarte intacto e, na outra mão, traz o cálice sagrado.


Um comentário:

  1. Muuuito legal saber o que está por trás das coisas (ou seria pela frente??? hehehe). Estão na fachada, não é mesmo?

    Aguardo ansioso o esmiuçamento e a divulgação daquelas demais imagens que detalhadamente fotografamos e com as quais tanto ficamos intrigados, conjecturando a respeito.

    Muito "didática", para os observadores de qualquer época, aquela parte do "capetinha sacana da balança" e dos "capetóides com aquele 'povo' todo (reis inclusive!) cozinhando nos caldeirões do inferno"!

    Uaaaau!

    Luís

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