sábado, 31 de julho de 2010

Subindo a torre da Notre Dame

Despertamos felizes depois de um sono embalado à vinho e champagne francês. Em nosso terceiro dia em Paris havíamos decidido ir à Notre Dame, que era a escolha do Ivan. Como as igrejas abrem bem mais cedo que os museus, tomamos café cedinho, pegamos o metrô e descemos na estação Châtelet, que a essa altura já chamávamos carinhosamente de nossa estação Paraíso, porque aqui em São Paulo é dela que geralmente partimos para nossos programas culturais.

Nesse dia chegamos tão cedo que praticamente "acordamos" as esfinges da fonte: elas começaram a jorrar água assim que saímos do metrô para a calçada. Azar de uma mulher que estava sentada na beirada da fonte e que tomou um banho quando o primeiro jorro veio bem em cima dela...

Passamos pela bilheteria do Palácio da Justiça e já compramos os ingressos para, após o almoço, visitarmos a Saint Chapelle e a Conciergerie. Continuamos nossa caminhada e chegamos à Notre Dame.


Iniciada em 1163, a catedral levou 200 anos para ficar pronta e até o século XIII era o maior edifício religioso ocidental. Teve sua estatuária danificada durante a Revolução Francesa e a partir de meados do século XIX é que se iniciou a sua restauração.

A vista externa da igreja é magnífica, mas resolvemos entrar na fila de subida da torre para aproveitar que as pernas ainda estavam descansadas, porque se deixássemos pro final da tarde, seria impossível. Faltavam ainda 15 minutos pra que o acesso às torres fosse liberado, então ficamos nos revezando na fila e fotografando a lateral da igreja.







































Acesso liberado, a fila começou a andar. Dois funcionários controlavam para que as pessoas subissem em grupos de 20, e na nossa vez, ficamos separados: Natália e eu seguimos e os outros três tiveram que aguardar mais um pouco. Nada de muito grave, nos encontramos lá em cima.


A primeira parada é na sala alta da torre norte, onde atualmente funciona a lojinha de souvenirs oficiais da Notre-Dame. Seu teto é formado pelo encontro de arcos ogivais e no fundo da sala há uma escada em espiral construída como se fosse uma torre.





















Saindo da lojinha, havia uma abertura na parede por onde podíamos ver a parte superior dos arcobotantes da catedral.





Depois disso começamos a subir uma escada em espiral que não acabava mais! Era muito degrau! O pior é que os coitados estão pra lá de gastos de tanta gente que passa por eles...




sexta-feira, 30 de julho de 2010

Piquenique no quarto do hotel

Saímos do trem da RER na estação seguinte e notamos que havia mais uma coisa vazando na sacola: agora era o queijo roquefort. Ele estava acondicionado numa bandejinha de isopor e embalado com papel filme, só que como o queijo "suou", molhou o papel filme e as superfícies dele que estavam grudadas, desgrudaram. A sorte é que como a manteiga tinha sido comprada pra passar no pão que comeríamos com o roquefort, lá foi ele pra mesma sacolinha plástica.

Seguimos na direção indicada pelas placas para o acesso à linha 1 do metrô e de repente nos vimos frente a uma linha de catracas. Aí começaram as dúvidas: já que utilizamos o bilhete na entrada da estação da RER, a catraca interna seria liberada? Tentamos e descobrimos que não, ela travava. Outra possibilidade: o bilhete que utilizamos pra entrar na estação da RER poderia ser utilizado novamente? Achamos que sim, porque já tínhamos estranhado o fato do bilhete voltar pra nossa mão depois que a gente o inseria pra liberar a catraca; se ele pudesse ser utilizado em uma das que ligam uma linha a outra, então a coisa faria sentido.

Estávamos com um monte de passes de metrô usados, já que, ao contrário dos parisienses, não os jogávamos no chão da estação ou nas áreas externas próximas a elas, e fizemos a tentativa. Também não deu certo. Só que pelo fato de termos vários passes usados, não sabíamos mais quais deles tinham sido usados naquele dia e na estação anterior e quais os dos dias anteriores. A Rejane então pegou outro passe usado e arriscou. A catraca foi liberada e a porta que fica ao final da catraca se abriu. A Rejane passou e voltou-se pra nós, tentando nos passar o bilhete que ela havia usado, ao que parecia. Só que nenhum de nós entendeu o que ela queria, e aí a porta se fechou sobre ela.

Posteriormente os boatos foram de que ela segurou a porta do metrô de Paris com os peitos, mas isso não passa da mais deslavada mentira! A verdade é que as duas folhas da porta se fecharam em seus braços e esses, por sua vez, por uma reação natural da pessoa, comprimiram os peitos. Para se livrar do aperto a Rejane forçou a porta de volta pra fora, e aí ela se abriu e continuou aberta. Como nós estávamos indo em direção a ela para livrá-la do "aperto", aproveitamos a porta aberta e a catraca liberada: eu passei primeiro e aí ficamos as duas chamando os outros que estavam meio sem saber o que fazer. No final, "vazamos" todos os cinco com o único bilhete que ela havia colocado.

Continuamos nosso caminho, agora morrendo de rir, e percebemos que para chegarmos até a plataforma da linha 1 teríamos um longo caminho pela frente, pois, no caso de algumas conexões, o que fazemos é caminhar por baixo da terra de uma estação à outra. Quando isso ocorre, na parte plana do caminho há esteiras rolantes, como as dos aeroportos, que costumam ter no mínimo 50m.

Lá também há a recomendação pra que quem não está com pressa fique do lado direito, só que os franceses passam voando pela esquerda, é muito mais rápido do que acontece nas escadas rolantes do nosso metrô em São Paulo. Como não era o nosso caso, nós geralmente íamos caminhando mais devagar pela direita mesmo e, eventualmente, ultrapassávamos alguém que tinha ainda menos pressa que nós e que estava simplesmente deixando a esteira fazer o seu serviço.

Nesse dia fomos no nosso ritmo até ficarmos atrás de uma moça muçulmana que estava com um bebê num carrinho. Detalhe: as muçulmanas em Paris usam roupas normais, como calças jeans, blusas justas, tênis... O que as identifica é apenas o lenço cobrindo os cabelos. Continuando, como o carrinho era "veículo longo", não ia dar pra eu ultrapassá-la, porque os franceses vinham vindo pela esquerda em linha quase contínua, portanto me coloquei uns dois ou três passos atrás dela e na sequência pararam também a Rejane, o Ivan, a Natália e o Luís.

Quando chegamos ao fim da esteira, não sei se a moça se distraiu por estar conversando com uma amiga que estava na frente do carrinho ou se era falta de prática de andar por lá mesmo, mas o fato é que ela não levantou as rodinhas dianteiras do carrinho de bebê, e aí ele fez-que-foi-e-não-foi. Conclusão: o carrinho voltou, ela trombou com o carrinho, eu trombei nela, a Rejane trombou em mim... o maior engavetamento humano na saída da esteira do metrô, porque a esteira continuava rolando.

O Ivan foi dando pulos pra trás, quando viu o tamanho da encrenca, da mesma forma que a Natália, e o Luís não quis nem saber se vinha gente pela esquerda e já "mudou de faixa". Parecia cena de filme pastelão!

Conseguimos nos livrar do amontoado antes que mais gente nos atropelasse e continuamos nosso caminho em direção à linha 1, rindo ainda mais. Num determinado momento as indicações para essa linha se dividem, porque há duas plataformas, cada uma com trens seguindo numa direção, já que não estávamos em nenhuma das duas "pontas" da linha. Quando surgiram duas indicações pra linha 1, o Ivan não teve dúvidas e virou à direita numa escada que indicava "La Défense". Só que nosso rumo era pro outro lado, e começamos a chamá-lo de volta, com grande dificuldade por estarmos todos rindo ao mesmo tempo. Claro que essa escada para onde o Ivan foi tinha que ser uma das poucas rolantes, e lá foi ele descendo pela escada que só subia, e tendo que se esforçar porque a velocidade delas (talvez pra combinar com o ritmo francês) é bem maior que as do nosso metrô paulista.

Quando entramos no trem não conseguíamos mais nem respirar de tanto dar risada, foi muito mico pra um dia só! E o Luís ainda comentava que, se houvesse câmaras nas estações (nós não reparamos, mas nos baseamos no que ocorre em São Paulo), ou daqui a pouco o trem iria parar e os seguranças nos tirariam de lá por termos passado sem bilhetes na catraca ou então estariam rindo ainda mais do que nós por ter visto esse bando de caipiras se atrapalhando no metrô.

Conseguimos chegar sem mais nenhuma trapalhada à "nossa" estação um pouco antes das nove da noite. Ao sairmos pra rua, olhamos esperançosos para a esquina em frente, onde ficava a brasserie em que Luís, Rejane e Natália haviam comido a quiche no dia em que chegamos, e que também vendia pães - o que faltava para completar nossa refeição. Só que o sinal estava fechado pra nós, e antes que ele abrisse, vimos um dos funcionários fechando a porta do estabelecimento. Atravessamos assim mesmo, olhamos pelas vitrines, mas não teve jeito, não é como no Brasil que se dá um jeitinho pra atender os clientes.

Decidimos então nos separar em dois grupos: Rejane e Luís iriam direto pro hotel pedir ao recepcionista o favor de guardar os vinhos e os queijos na geladeira deles (claro que com um quarto daquele tamanho não havia frigobar) até a hora em que fôssemos comer, e Ivan, Natália e eu seguimos a rua em busca de pão.

Havia muitos restaurantes e bistrôs abertos, mas não dava pra entrar e pedir que eles nos vendessem os pães que compraram pra servir para os clientes. Porém, nem tudo estava perdido: seguindo a rue Saint Antoine para o lado em que ainda não tínhamos ido, vimos um 8 à huit, supermercado pequeno do grupo Carrefour. Entramos ventando, antes que eles fechassem a porta na nossa cara, afinal eram quase nove da noite e o nome do estabelecimento deixava claro que eles funcionavam das 8 à 8. Claro que não encontramos pão fresco, apesar do sonho em comer aqueles queijos e patês todos com baguettes, mas havia croissants (embalados como nossas bisnaguinhas Panco) e... pão integral! Nada a ver comer queijos fortes e ricos em gordura com esse tipo de pão, mas fazer o quê? Ao menos havia de vários tipos, pudemos escolher.

Voltamos ao hotel e ficamos sabendo que o recepcionista daquela noite não era o Zehir, que falava inglês e entendia alguma coisa de português, nem a mocinha magrinha que também era boa em inglês, mas um que só falava francês. Não sei como a Rejane e o Luís fizeram, mas ele teve a maior boa vontade em colocar os queijos e os vinhos na geladeira enquanto íamos tomar banho. Não deu coragem de pedir pra eles colocarem também a manteiga, ela estava num estado lastimável, mas a Rejane teve uma boa ideia: na hora em que fôssemos buscar tudo, pediríamos um balde com gelo pra deixar os vinhos, e aí colocaríamos a manteiga no meio do gelo por alguns minutos pra ela ficar numa consistência razoável.

Ficamos sabendo também que a Anne havia ligado e deixado recado, mas nessa noite não iríamos sair mesmo, então tentei apenas avisá-la disso, mas novamente não foi possível. Combinamos de nos encontrar no quarto do Luís em mais ou menos uma hora, já que era o único com mesinha e cadeiras. Mesmo assim Rejane e eu levamos cada uma uma cadeira de seu próprio quarto. Elas eram bem leves, de plástico, então não houve problema.

Depois de um belo banho, fomos todos pro "sótão" do Luís começar a comilança.

O único problema é que quando fomos pegar os vinhos e os queijos, o recepcionista disse que não tinham balde pra colocar o gelo, portanto a manteiga foi utilizada do jeito que estava. Considerando que à noite era mais fresquinha do que aquele calorão da tarde, até que não foi assim tão ruim...

Além de rirmos muito relembrando os micos do dia, comentamos outra coisa que observamos e que vai de encontro ao que muita gente falava sobre a França: vimos muitas crianças e poucos cachorros em Paris. Talvez a campanha do Estado incentivando a natalidade tenha dado resultado, porque em nossas andanças pelo Quartier Latin e nossa estada nos Jardins de Luxemburgo, cruzamos com muitas famílias com crianças pequenas, desde bebês até crianças de 6 ou 8 anos. E até onde pudemos observar, eram francesas, não imigrantes de países mais pobres. Pode até ser que a maioria seja do interior e não de Paris, porque julho é mês de férias escolares e muita gente vem de outras cidades da França conhecer a capital, mas a impressão que dá é que alguma coisa mudou.

quinta-feira, 29 de julho de 2010

Rainhas nos Jardins de Luxemburgo

Nos Jardins de Luxemburgo existem vinte estátuas de rainhas de França e outras mulheres importantes.





Uma delas mostra Maria de Médicis, a rainha responsável pela constução do palácio de Luxemburgo original. Ela casou-se com Henrique IV em 1600, foi mãe e regente de Luís XIII, já que quando o pai morreu ele tinha apenas 9 anos, e ainda conseguiu ser amiga da primeira mulher de seu marido, a famosa rainha Margot (Marguerite de Valois), cuja estátua também está no jardim.





A rainha Margot era filha de Catarina de Médicis (Rejane, você tinha razão, eu é que tinha confundido os nomes) e como mulheres não herdam o trono na França, a mãe a casou com Henrique de Navarra, que era protestante, numa época de fortes conflitos religiosos na Europa. Foi durante as comemorações do casamento de Marguerite de Valois com Henrique, que depois tornou-se rei da França como Henrique IV, que Catarina ordenou o assassinato de dezenas de protestantes no que ficou conhecido como o Massacre da noite de São Bartolomeu.





Outra rainha poderosa cuja estátua também se encontra nos Jardins foi Blanche (ou Blanca) de Castela, esposa de Luís VIII. Ela organizou exércitos contra os ingleses, foi regente de seu filho, Luís IX (posteriormente São Luís) e, ao contrário de várias rainhas anteriores, que tinham problemas em engravidar, foi mãe de mais de uma dezena de crianças. Pelo fato de educá-los dentro de rígidos preceitos morais e religiosos, contou com o apoio do clero em mais de uma situação em que o apoio da Igreja Católica era decisivo.



Surpreendentemente, há também no local a estátua de uma rainha inglesa, Marguerite D'Anjou (o nome é em francês porque a mãe era duquesa da Lorena). Líder da casa de Lancaster pelo casamento com Henrique VI da Inglaterra, no período da Guerra das Duas Rosas, quando os York e os Lancaster lutavam pelo poder, por mais de uma vez assumiu a organização de exércitos. Conseguiu vitórias impressionantes e não demonstrava piedade com os líderes inimigos, mandando decapitá-los. Após uma de suas derrotas, foge para a França onde encontra refúgio. Em sua estátua é retratada com o único filho, Eduardo de Westminster, em nome de quem lutou. A frase a seus pés diz "Se vós não respeitais uma rainha proscrita, respeitais uma mãe desgraçada."



A primeira rainha de França, Clotilde, sob cuja influência o marido converteu-se ao cristianismo, não poderia ficar de fora. Foi por insistência dela que Clóvis, o responsável pela unificação do povo franco, aceitou a nova religião: na véspera de uma batalha decisiva, pediu à esposa que rezasse a seu deus para que este o abençoasse e lhe fizesse vencedor. Após a vitória, aceitou a conversão, que foi estendida a todo o seu povo.









Porém não há só rainhas nesse jardim: há também a estátua de Laure de Noves, a musa de Petrarca, poeta considerado o inventor do soneto e pai do Humanismo, um dos grandes valores dos intelectuais do Renascimento.







Apesar do jardim estar muito bom, estava na hora de voltar pro hotel e providenciar os pães pro nosso lanchinho, porque já passava das oito da noite. Localizamos no mapa uma estação de metrô por meio da qual poderíamos pegar um trem urbano da RER (rede expressa regional) e, na estação seguinte, fazer conexão com uma estação da linha 1 do metrô, a que passava perto de nosso hotel. Na hora de pegar as sacolas, uma surpresa - que não deveria ser assim tão surpreendente: a manteiga tinha derretido com aquele calorão todo e estava uma meleca. A sorte é que um de nós tinha uma sacolinha plástica (e tem gente que ainda acha que elas devem ser banidas completamente...) com lembrancinhas compradas em Cluny e nossa manteiga em estado quase líquido pode ser embrulhada e colocada de volta na sacola.

Saímos dos Jardins de Luxemburgo, mas não sem antes dar uma olhada numa estátua maravilhosa de um ciclope obeservando dois amantes distraídos.

Eu imaginava que a tal estação de metrô/RER ficava na rua que havíamos descido para ir do Panthéon até os Jardins, mas me enganei. O Ivan, então, assumiu a orientação do caminho e chegamos até onde queríamos. Só que, uma vez lá dentro, só conseguimos visualizar indicações para plataformas de outras linhas de metrô, e teríamos que dar uma volta enorme pela linha 10 até conseguir uma conexão com a 1. Já estávamos consultando nossos mapas pra ver como fazer, quando o Ivan encontrou a indicação correta e, tomado de uma indignação absoluta, exclamou "Tinha que ter RER!" e saiu andando rapidamente na direção indicada. Saímos atrás dele nos atropelando, e a Rejane pedindo "Calma, moço, vá mais devagar senão a gente não consegue acompanhar." Isso porque as estações de metrô de Paris que possuem conexões são muito grandes. Há escadas pra todos os lados, passagens, corredores e plataformas. Aliás, idoso, gestante e mulher com carrinho de bebê não tem vez nessa cidade, porque há pouquíssimas escadas rolantes nas estações mais antigas, e elevador, nem pensar!

Após uma correria, conseguimos alcançar o Ivan e chegamos à plataforma que queríamos. Pegamos o trem do RER e imediatamente sentimos a diferença: apesar dos trens não serem depredados e superlotados como os da CPTM, são igualmente reservados às classes menos favorecidas, dá pra perceber que mesmo em julho não é predominantemente utilizada por turistas, e sim por moradores da periferia da cidade. Há grande quantidade de negros e muçulmanos, sabidamente os imigrantes que exercem os trabalhos mais mal remunerados.

O Ivan comentou depois que se sentiu intimidado no trem, mesmo considerando que o utilizamos apenas para ir de uma estação à outra. "Os negros aqui não são assimilados como os do Brasil. Eles parecem, como dizem que acontece nos Estados Unidos, tirar algum orgulho de sua marginalização e formar tribos", ele observou. "A impressão que tive é que a qualquer momento um deles poderia chegar perto de mim e perguntar o que eu estava fazendo ali, já que aquele não era o meu lugar".

terça-feira, 27 de julho de 2010

O domo do Panthéon e os Jardins de Luxemburgo

Como embaixo, na cripta, não havia mais nada de nosso interesse, resolvemos inverter e subir: afinal, até o alto do domo não eram nem 300 degraus... pra quem já havia ido até o alto do Arco do Triunfo, era moleza! Mesmo com as sacolas cheia de compras.


A primeira parada era numa plataforma interna, por meio dela tínhamos a vista do interior do Panthéon vista beeeeem de cima. Quase dava pra ver o pêndulo de Foucault, uma experiência que foi feita em 1851 para demonstrar a rotação da terra em relação a um referencial. O fato dele ter liberdade de oscilação em qualquer direção prova essa rotação, e ainda permite que se determine a latitude do local onde a experiência é feita sem necessidade de qualquer cálculo astronômico anterior.



A essa altura, os cartões de memória da minha câmara já tinham acabado, ainda bem que a máquina fotográfica da Natália não deixou ninguém na mão.

Continuando a subida, saímos para uma espécie de varanda aberta de onde podíamos avistar o domo, nossa próxima parada.


Chegando lá, novamente a maravilhosa vista da cidade de Paris, desta vez ao sol da tarde. Bem pertinho estava a igreja de Saint-Étienne-du-Mont, que não visitamos, vimos só por fora mesmo.

















Ao longe, de um lado, a torre Eiffel e o domo dourado dos Invalides...











... do outro, a Notre-Dame...






... e no alto da colina de Montmartre, lá no horizonte, a igreja do Sacré-Coeur.


Descemos as escadas (desta vez não fomos os últimos), saímos do edifício e fomos atingidos por um sol daqueles. Calor senegalês, como costuma dizer a Rejane. Nossa próxima parada era nos Jardins de Luxemburgo, mas no caminho resolvemos fazer uma parada estratégica para uma cerveja geladinha. Agitamos um pouco o local porque, pra variar, só havia mesas pra no máximo quatro pessoas, então tivemos que colocar mais cadeiras em volta da mesinha, não só porque éramos cinco, mas por conta da comida que estávamos levando nas ecobags. O garçon era um senhor muito simpático que logo nos disse "Eu não sei falar português" em português! Parecia a gente decorando como se diz "Eu não sei falar francês" antes de viajar pra Paris...

Relativamente refrescados com a cerveja, pernas e pés cansados de tanto andar e subir escadas, chegamos ao Jardim de Luxemburgo. Ficamos apaixonados logo de cara pelo local, pois chegamos exatamente na parte onde há cadeiras disponíveis pra nos sentarmos embaixo das árvores e relaxar com a brisa fresquinha. O Ivan até tirou os tênis pra aproveitar melhor.

Na verdade não se trata de um jardim e sim de um grande parque. A parte com as árvores e as cadeiras formam uma espécie de U e em sua parte aberta (do U, não do parque) fica o Palácio de Luxemburgo, que hoje abriga o senado francês, por isso não pode ser visitado internamente.







Esse U é cercado por uma balaustrada decorada com vasos que estão super floridos nessa época do ano, e a espaços determinados há escadas pra se descer à área central dos Jardins, que fica num nível mais baixo do que aquele onde estávamos com as cadeiras.



Os jardins propriamente ditos têm um gramado impecável, mesmo porque ninguém pisa nele, se alguém quiser deitar na grama tem um espaço próprio pra isso. Além disso, apresentam uma enorme variedade de flores e entre as áreas gramadas há um laguinho com chafariz.


O Panthéon

Saímos dos jardins de Cluny esfomeados, mas decidimos procurar um lugar pra comer e deixar o piquenique pra de noite. Isso porque, pelo nosso roteiro, iríamos primeiramente ao Panthéon e depois aos jardins de Luxemburgo, onde seria interessante fazer a refeição, só que ninguém ia aguentar ficar sem comer por mais algumas horas. Inverter o programa e ir pro jardim e depois voltar, também não valeria a pena.

Fomos seguindo em direção ao Panthéon observando restaurantes e similares para nos decidir por um deles, quando avistamos um supermercado e resolvemos adquirir os itens para a refeição noturna. Compramos quatro tipos de queijos, vinho tinto e champagne, manteiga (a Rejane comentou que era indispensável pra comer com o Roquefort) e deixamos pra comprar os pães na hora. Como todo mundo diz que na Europa a pessoa tem que pagar se utilizar sacolinha de plástico pra acondicionar as compras no supermercado, Luís e Rejane levavam com eles suas ecobags, e foi nelas que colocamos tudo, nos revezando para carregá-las. Só que todo mundo por lá usa sacola de plástico como aqui, não tem nada desse negócio de pagar qualquer taxa adicional.

Circulando mais um pouco pelo bairro, passamos por vários prédios da Sorbonne, entre eles o da Universidade René Descartes, a Universidade de Paris IV. A primeira de suas unidades foi criada no final do século XI e foi uma das primeiras da Europa - e do mundo.


Passamos por uma rua estreitinha onde havia dois ou três restaurantes, mas a maioria, nesse horário, servindo mais sanduíche e coisas do gênero, e a fresca aqui achou que valia a pena procurar algo melhor. A essa altura, além da fome estávamos com calor, porque o sol estava forte, e ainda carregando as compras, o que não contribuía pra aumentar o bom humor de ninguém, então, antes que eu apanhasse (merecidamente, diga-se de passagem), optamos por um lugar bonitinho com mesas no segundo andar.

Lá em cima era meio abafado, por causa do teto baixo, mas a garçonete era uma simpatia e uma cerveja ou vinho gelado já resolveu metade dos nossos problemas. Os restantes se acabaram diante dos pratos, todos muito bons. O Ivan e a Natália comeram brochettes de boeuf, ou cubinhos de carne de boi no espeto, com mostarda de Dijon e eu pedi uma massa à provençal. Com isso confirmei minhas suspeitas: aqui no Brasil, quando se pede algo à provençal a comida vem com grande quantidade de alho (adoro!), mas na França o que caracteriza esse estilo de prato é a variedade de legumes.

Refeitos e bem alimentados, pegamos as sacolas e continuamos caminhando em direção ao Panthéon. No caminho paramos numa farmácia pra Rejane comprar um par de óculos, já que os que ela levou haviam sofrido um acidente: no primeiro dia, quando caminhamos em direção à Île Saint Louis, paramos num cruzamento próximo à place de la Bastille. Como a praça é redonda e dela saem inúmeras ruas, é complicado de atravessar, é preciso prestar a máxima atenção ao semáforo e aos carros que não os respeitam. O sinal ainda não havia aberto pra nós, mas os parisienses, ao verem que o fluxo de um dos lados da praça havia parado, aproveitaram pra atravessar antes que os carros do outro lado viessem. A Rejane foi no embalo e precisou dar uma corridinha pra chegar ao outro lado da rua, que era larga. Nós ficamos na calçada aguardando e assistindo ao desastre: os óculos dela, que estavam dobrados e colocados na gola da camiseta, caíram quando ela correu. A Rejane nem percebeu, mas nós ficamos na maior expectativa, vendo o primeiro carro (que passou com as rodas ao lado dos óculos), o segundo (que passou com o pneu bem por cima deles), o terceiro (que também acertou em cheio)...


Quando o sinal abriu pra nós, a Natália, louca da vida, recolheu os óculos da mãe e ainda foi dar a maior bronca nela. A sorte é que nos informamos e soubemos que as farmácias vendem óculos por preços acessíveis, e nesse dia, na própria rue de la Sorbonne, encontramos uma delas e tudo ficou resolvido.









Continuamos a caminhada e chegamos ao nosso destino. O Panthéon, edificado em forma de cruz grega, foi projetado para ser uma igreja, mas com a Revolução Francesa (sempre ela!), tornou-se o mausoléu dos intelectuais franceses e uma espécie de templo ao pensamento racional iluminista.

O local é perfeito para a exaltação do racionalismo, pois sua arquitetura de linhas neoclássicas remete ao pensamento investigativo e analítico dos filósofos e sábios gregos e romanos e dos intelectuais do Renascimento. O curioso é que os iluministas, tão avessos à religião e adoração de santos e figuras sagradas, criaram um templo que pode ser considerado também uma igreja, com a homenagem e reverência que é conferida aos intelectuais revolucionários.

Em seu monumental interior, vêem-se estátuas representando passagens da Revolução Francesa, como uma enorme alegoria da Convenção Nacional, o período em que os revolucionários mais radicais, menos preocupados em defender os interesses burgueses, estiveram no poder. Situada numa espécie de altar, presta-se à adoração da mesma forma que as imagens sacras nas igrejas cristãs, tão combatidas pelo racionalismo iluminista.

Em seu subsolo há uma cripta com os mausoléus de Voltaire, Rousseau, Descartes, Marie e Pierre Curie, Alexandre Dumas, Victor Hugo e Émile Zola, entre outros. Porém, curiosamente, não há emoção ao vê-las, pois é tudo tão geométrico, exato, asséptico, que nem parece que naquele local repousam homens e mulheres que se dedicaram com toda a sua alma aos estudos, à pesquisa, à revolução ou à literatura.

segunda-feira, 26 de julho de 2010

Cluny - as termas e as peças medievais

As "Termas do Norte" de Lutécia, como eram conhecidas, são o único conjunto arquitetônico galo-romano importante que se manteve de pé em Paris, apesar das sucessivas invasões das tribos germânicas e dos normandos, que não tinham o hábito de tomar banho. Ao que se sabe, suas três câmaras - Caldarium, para os banhos quentes, Tepidarium, para os banhos mornos e Frigidarium, para os banhos frios - mantiveram-se em atividade até o final do século III.

A parte que teve a abóbada restaurada e que está mais conservada é o Frigidarium, cujo pé direito chega à 14,70m.








As paredes originais foram construídas com pedras de cores diferentes agrupadas em faixas, dando um efeito decorativo. E nesse espaço também podemos ver um mosaico que se manteve intacto.
























Encontramos também uma banheira da época, quem se entusiasmou todo com ela foi o Luís, lembrando de suas aventuras na banheira do hotel.

Subimos as escadas de volta à entrada, crentes que a visita havia terminado. Ledo engano: havia ainda todo o andar de cima com peças maravilhosas referentes ao período medieval: mobiliário, pinturas, tapeçarias, armas, e uma capela com um teto de arcos entrelaçados em madeira que dava até tontura de olhar.






As peças de ourivesaria são impressionantes nos detalhes, como no caso de um ostensório (custódia onde se guarda a hóstia consagrada que será utilizada nas missas católicas) que imita um castelo.







Há também vitrais originais de Cluny e azulejos dos séculos XIV e XV.




















Na maior parte das salas as vitrines com os objetos ficavam à meia luz, o que impossibilitava fotografias, já que não era permitido utilizar flash. Mas as peças mais importantes nesse andar superior eram as tapeçarias. Elas não retratavam simplesmente uma cena campestre ou flores e animais, eram verdadeiras "histórias em quadrinhos", só que ao invés dos textos ficarem em balõezinhos, ficavam em faixas estendidas sobre a cena.

Numa delas, inclusive, pode se perceber a expressividade das figuras: a mulher, à esquerda, se submetendo aos príncipes da Igreja e do lado direito da figura, pessoas sendo mortas, talvez por uma conspiração, já que tudo acontece dentro dos aposentos e não num campo de batalha.

Porém, o conjunto de tapeçarias mais famoso do museu, o da dama com o unicórnio, não tem como ser fotografado. São seis peças tecidas no século XV que ficam na penumbra em uma sala semicircular; cinco delas ficam na parede circular, em sequência, e a sexta na parede reta. Todas elas têm o fundo vermelho e uma série de animaizinhos e plantas espalhados, sem perspectiva para dar profundidade de campo, mas com um detalhamento bastante cuidadoso: é possível identificar limoeiros, romãzeiras, macieiras e outras árvores, bem como coelhos, garças, raposas e até macacos. Na parte central de cada peça encontra-se uma dama (percebe-se que não é uma camponesa pelos trajes, joias e pelo porte da donzela), um leão e um unicórnio, um deles sempre segurando um estandarte de fundo vermelho com uma faixa diagonal azul onde se alinham três luas crescentes.

As cinco peças em sequência representam os cinco sentidos, de acordo com a ação que a dama exerce em cada uma: tecer uma grinalda de flores (olfato), tocar um instrumento musical (audição), servir-se de um doce (paladar), segurar um espelho (visão) e tocar o chifre do unicórnio (tato). A sexta tapeçaria é um pouco mais larga que as outras e mostra a dama em frente a uma tenda onde há uma faixa com o texto "Ao meu único desejo". Ao seu lado há uma criada com um baú aberto, onde a dama está colocando o colar que tinha no pescoço; o leão e o unicórnico continuam presentes, cada um de um lado, segurando o estandarte da família.

São várias as interpretações para essa última peça: uma delas defende que o abandono da joia significaria a renúncia às paixões suscitadas pelos sentidos e a vitória da vontade. Outra afirma que a cena representaria o sexto sentido, que seria o entendimento. E uma terceira segue a linha da anterior, mas identificando esse sexto sentido como o amor.

Ao sairmos dessa sala, fomos para os jardins do museu decidir sobre nosso almoço, se iríamos parar num restaurante ou comprar sanduíches em baguettes ou pão e queijo pra comer em algum parque. Isso porque já eram mais de duas horas da tarde e a fome estava brava!