Uma delas mostra Maria de Médicis, a rainha responsável pela constução do palácio de Luxemburgo original. Ela casou-se com Henrique IV em 1600, foi mãe e regente de Luís XIII, já que quando o pai morreu ele tinha apenas 9 anos, e ainda conseguiu ser amiga da primeira mulher de seu marido, a famosa rainha Margot (Marguerite de Valois), cuja estátua também está no jardim.
A rainha Margot era filha de Catarina de Médicis (Rejane, você tinha razão, eu é que tinha confundido os nomes) e como mulheres não herdam o trono na França, a mãe a casou com Henrique de Navarra, que era protestante, numa época de fortes conflitos religiosos na Europa. Foi durante as comemorações do casamento de Marguerite de Valois com Henrique, que depois tornou-se rei da França como Henrique IV, que Catarina ordenou o assassinato de dezenas de protestantes no que ficou conhecido como o Massacre da noite de São Bartolomeu.
Outra rainha poderosa cuja estátua também se encontra nos Jardins foi Blanche (ou Blanca) de Castela, esposa de Luís VIII. Ela organizou exércitos contra os ingleses, foi regente de seu filho, Luís IX (posteriormente São Luís) e, ao contrário de várias rainhas anteriores, que tinham problemas em engravidar, foi mãe de mais de uma dezena de crianças. Pelo fato de educá-los dentro de rígidos preceitos morais e religiosos, contou com o apoio do clero em mais de uma situação em que o apoio da Igreja Católica era decisivo.
Surpreendentemente, há também no local a estátua de uma rainha inglesa, Marguerite D'Anjou (o nome é em francês porque a mãe era duquesa da Lorena). Líder da casa de Lancaster pelo casamento com Henrique VI da Inglaterra, no período da Guerra das Duas Rosas, quando os York e os Lancaster lutavam pelo poder, por mais de uma vez assumiu a organização de exércitos. Conseguiu vitórias impressionantes e não demonstrava piedade com os líderes inimigos, mandando decapitá-los. Após uma de suas derrotas, foge para a França onde encontra refúgio. Em sua estátua é retratada com o único filho, Eduardo de Westminster, em nome de quem lutou. A frase a seus pés diz "Se vós não respeitais uma rainha proscrita, respeitais uma mãe desgraçada."
A primeira rainha de França, Clotilde, sob cuja influência o marido converteu-se ao cristianismo, não poderia ficar de fora. Foi por insistência dela que Clóvis, o responsável pela unificação do povo franco, aceitou a nova religião: na véspera de uma batalha decisiva, pediu à esposa que rezasse a seu deus para que este o abençoasse e lhe fizesse vencedor. Após a vitória, aceitou a conversão, que foi estendida a todo o seu povo.
Porém não há só rainhas nesse jardim: há também a estátua de Laure de Noves, a musa de Petrarca, poeta considerado o inventor do soneto e pai do Humanismo, um dos grandes valores dos intelectuais do Renascimento.
Apesar do jardim estar muito bom, estava na hora de voltar pro hotel e providenciar os pães pro nosso lanchinho, porque já passava das oito da noite. Localizamos no mapa uma estação de metrô por meio da qual poderíamos pegar um trem urbano da RER (rede expressa regional) e, na estação seguinte, fazer conexão com uma estação da linha 1 do metrô, a que passava perto de nosso hotel. Na hora de pegar as sacolas, uma surpresa - que não deveria ser assim tão surpreendente: a manteiga tinha derretido com aquele calorão todo e estava uma meleca. A sorte é que um de nós tinha uma sacolinha plástica (e tem gente que ainda acha que elas devem ser banidas completamente...) com lembrancinhas compradas em Cluny e nossa manteiga em estado quase líquido pode ser embrulhada e colocada de volta na sacola.
Saímos dos Jardins de Luxemburgo, mas não sem antes dar uma olhada numa estátua maravilhosa de um ciclope obeservando dois amantes distraídos.
Eu imaginava que a tal estação de metrô/RER ficava na rua que havíamos descido para ir do Panthéon até os Jardins, mas me enganei. O Ivan, então, assumiu a orientação do caminho e chegamos até onde queríamos. Só que, uma vez lá dentro, só conseguimos visualizar indicações para plataformas de outras linhas de metrô, e teríamos que dar uma volta enorme pela linha 10 até conseguir uma conexão com a 1. Já estávamos consultando nossos mapas pra ver como fazer, quando o Ivan encontrou a indicação correta e, tomado de uma indignação absoluta, exclamou "Tinha que ter RER!" e saiu andando rapidamente na direção indicada. Saímos atrás dele nos atropelando, e a Rejane pedindo "Calma, moço, vá mais devagar senão a gente não consegue acompanhar." Isso porque as estações de metrô de Paris que possuem conexões são muito grandes. Há escadas pra todos os lados, passagens, corredores e plataformas. Aliás, idoso, gestante e mulher com carrinho de bebê não tem vez nessa cidade, porque há pouquíssimas escadas rolantes nas estações mais antigas, e elevador, nem pensar!
Após uma correria, conseguimos alcançar o Ivan e chegamos à plataforma que queríamos. Pegamos o trem do RER e imediatamente sentimos a diferença: apesar dos trens não serem depredados e superlotados como os da CPTM, são igualmente reservados às classes menos favorecidas, dá pra perceber que mesmo em julho não é predominantemente utilizada por turistas, e sim por moradores da periferia da cidade. Há grande quantidade de negros e muçulmanos, sabidamente os imigrantes que exercem os trabalhos mais mal remunerados.
O Ivan comentou depois que se sentiu intimidado no trem, mesmo considerando que o utilizamos apenas para ir de uma estação à outra. "Os negros aqui não são assimilados como os do Brasil. Eles parecem, como dizem que acontece nos Estados Unidos, tirar algum orgulho de sua marginalização e formar tribos", ele observou. "A impressão que tive é que a qualquer momento um deles poderia chegar perto de mim e perguntar o que eu estava fazendo ali, já que aquele não era o meu lugar".
"O que você faz aqui, menino branco?" imagino que o cara iria dizer para o Ivan. Apartheid nos tempos de hoje, é?
ResponderExcluirIsso é uma das coisas que me incomodou lá fora, mesmo como turista. Quem mora no país e tem outra cultura não se integra, formam pequenos bolsões de e "não se misturam". Acho isso muito ruim.